quarta-feira, 22 de julho de 2009

Antiquada

Moro em uma casa com cerca de 4.000 livros. Ocupam um espaço terrível e acumulam uma quantidade de pó mais terrível ainda. Mas eu não abro mão do papel.
Deu até uma dorzinha no coração quando eu li essa reportagem:

Amazon faz papel de Grande Irmão e apaga arquivos do Kindle

Eu não acho que gostar de ler no papel me faça uma leitora mais legítima. Só que, pelo menos, se eu deixo o livro na cabeceira, sei que ele não vai ter sumido no dia seguinte, quando eu acordar.

Primeiro Amor (1)

Bom, antes de começar, acho que é importante dizer que eu não sou fã em especial do Beckett. Na verdade, acho Esperando Godot um porre - ok, eu só vi uma montagem e não era grande coisa. Primeiro amor, porém, é um conto curto e foi - tenho até vergonha de confessar - um livro comprado pela estética da capa, dos desenhos do lado de dentro e por causa do título.
Quando li a primeira frase - Associo, com ou sem razão, o meu casamento à morte do meu pai, em outros tempos - lembrei, com ou sem razão, de Carta ao pai, do Kafka. Agora, é impossível deixar de confundir os dois livros e imaginar o narrador/personagem como um moleque franzino e intelectual. No fim, nem deve ser diferente disso: conforme se avança na leitura, percebe-se que se se trata de um verdadeiro solitário, que prefere passear no cemitério do que em parques. São impressionantes os preconceitos: não consigo, juro, por mais que tente, visualizar alguém como, digamos, o professor da minha academia, vagando sozinho por um cemitério e elegendo o seguinte epitáfio:

Aqui jaz quem daqui tanto escapou
Que só agora não escape mais

E assim não se vê quanta gente quer escapar.

sábado, 18 de julho de 2009

Primeiro amor

Que vontade louca de drama.

Pradva Pravda

Totalmente fora do propósito desse site. Bom, nem tanto, se considerarmos que meus (muitos) sonhos são o principal material dos (poucos) contos que escrevo. Em resumo: sonhei que tinha feito uma viagem a Pradva que, em sonho, era a capital da Croácia. Não é essa a capital da Croácia (ia ser maravilhoso se, além de bizarros, meus sonhos também fossem geograficamente precisos) e nem existe lugar com esse nome. Mas existiu um jornal na URSS chamado Pravda, palavra que significa verdade.

terça-feira, 14 de julho de 2009

Galeria Olido

Meu, eu vou só pra "escrever em folhas de papel" as minhas impressões.

Coord.: Rita Marques.
Para a atividade, são distribuídas, durante todo o mês, de segunda-feira a sábado, das 10h às 20h, cópias do conto A terceira margem do rio, de João Guimarães Rosa. Na última segunda-feira, os participantes se reúnem para comentar a narrativa. Os freqüentadores podem, também, escrever em folhas de papel suas impressões sobre o texto, para serem afixadas no Painel do Leitor.
Dia 27/7, 18h30

Adeus Adeus, Columbus

Não sei se foram os acontecimentos da última semana, mas o fato é que eu me enchi do Adeus, Columbus, dessa coisa judeus-em-nova-iorque-nos-anos-50. Tanto que o livro passou dias perdido e eu nem notei. E também não vou escolher nenhum livro de poesia pra pitacar. Não me importo que disse que ia: eu já mantenho promessas demais.
Vou escolher outra coisa pra ler.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Tigre

Sou prosa, definitivamente. Não que nem na música da Rita Lee. Só quero dizer que tenho uma clara preferência pela prosa (contos, mais especificamente) do que pela poesia. Mas andei pensando em escolher um livro de poesia pro próximo pitaco (ok, eu tenho que terminar o Adeus, Columbus). Só pra ir esquentando minha idéia, segue um poema do Neruda, um trecho da Hilda Hilst e um pequeno do Pessoa.

El Tigre - Pablo Neruda

Soy el tigre.
Te acecho entre las hojas
anchas como lingotes
de mineral mojado.

El río blanco crece
bajo la niebla. Llegas.

Desnuda te sumerges.
Espero.

Entonces en un salto
de fuego, sangre, dientes,
de un zarpazo derribo
tu pecho, tus caderas.

Bebo tu sangre, rompo
tus miembros uno a uno.

Y me quedo velando
por años en la selva
tus huesos, tu ceniza,
inmóvil, lejos
del odio y de la cólera,
desarmado en tu muerte,
cruzado por las lianas,
inmóvil, lejos
del odio y de la cólera,
desarmado en tu muerte,
cruzado por las lianas,
inmóvil en la lluvia,
centinela implacable
de mi amor asesino.


Para ti, V - Hilda Hilst

Águas. Onde só os tigres mitigam a sua sede.
Também eu em ti, feroz, encantoada
Atravessei as cercaduras raras
E me fiz máscara, mulher e conjetura.
Águas que não bebi. Crespusculares. Cavas.
Códigos que decifrei e onde me vi mil vezes
Inconexa, parca. Ah, toma-me de novo
Antiqüíssima, nova. Como se fosses o tigre
A beber daquelas águas.


O que o seu jeito revela - Fernando Pessoa

O que o seu jeito revela
Sabe à vista como um gomo,
E a vida tem fome dela
Nos dentes do seu assomo.

E nele mesmo, vibrante
A esse corpo de amor,
Espreita, próximo e distante,
O seu tigre interior.

Toda vez que eu leio esse poema do Neruda já fico achando que sou poesia. Ele me dá calafrios.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Open Window

Vamos inverter a ordem: pra não estragar, primeiro tem que ler The open window. Depois pode terminar de ler o post.

Justiça seja feita ao meu tio: pode até ter sido ele quem me contou a história do quadro, mas inventar historinhas desse gênero sempre foi regra na minha casa: somos judeus, somos parentes do Al Capone, vemos apenas em preto e branco, somos desdencentes do Cervantes, o fantasma da D. Antônia vive em casa, é possível falar com os mortos usando um rádio de vávula e assim por diante. E a prova cabal disso é que, quando eu era criança, o meu pai me fazia ler esse conto e gostava de dizer que eu era igualzinha à menina.

Adeus, Columbus (4)

Ah, eu não disse que Adeus, Columbus é o nome de uma música que "toca" no conto. O conto é de 1959, o filme é de 1969. A música não existia, foi composta para o filme. Aqui em http://www.youtube.com/watch?v=WGerL1-MpSU&feature=related.
Eu imaginava uma música melancólica, numa voz grossa de homem, cantando assim: gooooooooodbye, columbus (columbus meio arrastado, quase pela metade), com aquele sonzinho de vinil - e tinha que ser a ultima faixa, pra terminar com o barulho da vitrola desligando.

Em tempo: hoje fui tirar a limpo a história do quadro da minha avó e descobri que fui alvo de uma cruel invenção. Pelo que consta dos arquivos da memória do meu pai, "esse quadro não tem nada a ver com a bíblia" e "deve ter sido o seu tio Zé Luiz quem te contou essa história".

domingo, 5 de julho de 2009

Adeus, Columbus (3)

É impressionante como sou sugestionável, seja para criar expectativas em relação a determinado livro, seja para confirmar o gosto por um certo filme. Explico: vi, na semana passada, pela 3ª vez, Despertar de uma paixão (baseado em O Véu Pintado, do W. Somerset Maugham), e toda vez que eu vejo esse filme choro loucamente - mas sempre tive consciência que devia ser coisa de mulherzinha. Quando fui devolver o filme na locadora, a atendente começou a elogiar o filme e eu me senti mais legitimada pra gostar dele (não li o livro, mas duvido que seja tão impressionante, juro, a cena em que toca La claire fontaine é de partir o coração).
Com Adeus, Columbus foi meio parecido: o vendedor disse que o livro tinha sido uma experiência determinante na adolescência dele. Ok, eu não sou ele. Mas eu li essa primeira história com a expectativa que vem com todo livro recomendado. Só que me pareceu mais uma provocação do que uma lição. Esse conto me fez passar vontade. E, pra piorar, tem no youtube a cena da piscina: http://www.youtube.com/watch?v=SH2Xs7N-hPM. É por isso que eu odeio o inverno.


quinta-feira, 2 de julho de 2009

Adeus, Columbus (2)

Ainda sobre A conversão dos judeus. Eu tinha selecionado um trecho, mas achei que o outro post já estava grande demais. É uma parte logo depois de o menino ter subido no telhado da escola, num ataque de fúria/revolta/sei lá o que:

Uma pergunta explodiu em seu cérebro. "Mas isso sou eu, mesmo?" Em se tratando de um garoto de trezes anos que havia acabado de chamar seu líder religioso de filho-da-puta, e duas vezes, a pergunta procedia. Cada vez mais alto, a pergunta se repetia para ele - "Sou eu? Sou eu?" - até que Ozzie deu por si não mais ajoelhado, e sim correndo como um louco em direção à beira do telhado, os olhos chorando, a garganta gritando e os braços agitando-se para todos os lados, como se não lhe pertencessem.
"Sou eu? Sou eu EU EU EU EU? Tem que ser eu - mas será?"
É a pergunta que um ladrão certamente faz a si próprio na noite em que abre com um pé de cabra sua primeira janela, e diz-se que é também a pergunta que o noivo dirige a si próprio diante do altar.
(...)
Porém, a cena lá embaixo resolvia todas as dúvidas, pois há um momento em qualquer ação em que a questão de você ser você ou ser outra pessoa se torna acadêmica. O ladrão enfia o dinheiro nos bolsos e sai pela janela afora. O noivo assina o livro de recepção do hotel, pegando um quarto para dois. E o menino no telhado se depara com toda uma rua cheia de gente olhando para o alto, para ele, pescoços esticados para trás, rostos levantados, como se ele fosse a cúpula do planetário Hayden. De repente você tem certeza de que você é você.

Eu gosto de questão de você ser você ou ser outra pessoa se torna acadêmica.

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Adeus, Columbus (1)

Bom, como é um livro de contos, eu não tive que seguir a ordem dos numerinhos das páginas e fui direto para A conversão dos judeus.
Trata-se de uma história de um menino que, na aula, ouve o professor dizer que é impossível que Jesus tenha nascido de uma mulher virgem e faz a seguinte pergunta: Se deus foi capaz de criar o mundo, se ele é capaz de fazer qualquer coisa, então porque não pode fazer com que uma mulher tenha um filho sem ter feito sexo? A pergunta é demais e me lembra um episódio parecido da minha infância: na casa da minha avó paterna havia um quadro (que eu considerava assustador) de uma mulher sendo levada pela correnteza e se segurando em uma cruz gigante de madeira, que brotava do fundo do rio. Quando perguntei a história da quadro, me disseram que ela estava se afogando e pediu a deus que a salvasse: eis que deus, com todo seu poder, fez surgir a tal da cruz e ela não se afogou. Ora, eu pensava, se deus podia salvá-la, era melhor que a tivesse tirado de dentro do rio, ou feito a correnteza parar...mesmo porque, se vocês pudessem ver o quadro entenderiam, ela continua fazendo cara de desespero e com medo de se afogar. Uma hora ela vai ficar cansada, vai soltar da cruz e vai morrer.
Enfim, quando minha avó faleceu, fiz questão de trazer esse quadro pra casa. Ele está abandonado dentro de um box em desuso.